STJ decide que contrato de união estável sem registro não produz efeitos perante terceiros


Notícias 22/11/2022

No caso em apreço, foram ajuizados, pela recorrente, embargos de terceiro no cumprimento de sentença proposto contra seu companheiro, contestando a penhora de móveis e eletrodomésticos, que seriam apenas dela, para o pagamento de uma dívida exclusiva dele. A embargante alegou que a união estável em que viviam passara a ser disciplinada pelo regime da separação total de bens em decorrência do instrumento particular firmado pelas partes em abril de 2014, e que os bens penhorados foram adquiridos apenas pela recorrente após essa data.

A sentença julgou parcialmente procedentes os embargos de terceiro, apenas para resguardar a meação da recorrente e permitir que o produto da alienação dos bens móveis penhorados fosse revertido, em parte, a ela. Interposta apelação pela embargante, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná negou provimento ao recurso, ao fundamento de que o regime vigente na união estável no momento do pedido da penhora era o de comunhão parcial de bens, o que levou à interposição do recurso especial em questão.

De acordo com a relatora do especial, Min. Nancy Andrighi, a hipótese em discussão não tratava exatamente sobre a irretroatividade dos efeitos do registro da separação total de bens celebrada entre os conviventes, como constou no acórdão recorrido, e, sim, sobre a abrangência dos efeitos produzidos pelo instrumento particular e por seu posterior registro.

A ministra também afirmou que, conforme prevê o art. 1.725 do Código Civil, o único requisito para que haja a fixação ou a modificação, sempre com efeitos prospectivos, do regime de bens aplicável à união estável é a existência de contrato escrito. Destacou que tal instrumento particular terá eficácia e vinculará as partes independentemente de qualquer espécie de publicidade e registro, sendo relevante para definir questões internas da união estável, mas é “verdadeiramente incapaz de projetar efeitos para fora da relação jurídica mantida pelos conviventes, em especial em relação a terceiros porventura credores de um deles”.

Dessa forma, verificando, em análise dos autos, que a penhora dos bens móveis havia sido requerida e deferida pelo juiz em junho de 2018 e o registro em cartório do instrumento particular de união estável com cláusula de separação total de bens havia sido efetivado apenas em julho de 2018, a relatora asseverou que, no momento do deferimento da medida constritiva, o contrato era de ciência exclusiva dos conviventes. Sendo assim, o instrumento não projetava efeitos externos à união estável e, consequentemente, era inoponível à recorrida. Logo, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso, confirmando o acórdão recorrido, inclusive no que se refere ao resguardo da meação da recorrente, com destinação à meeira do produto da alienação dos referidos bens.

Considerando que o registro do contrato da união estável foi realizado somente um mês após a ordem de penhora dos bens, a ministra Nancy Andrighi ainda ressaltou que “o registro se deu como uma tentativa de excluir os bens supostamente exclusivos da recorrente da constrição que seria empreendida”, especialmente considerando que o devedor havia sido intimado e, portanto, tinha ciência da penhora.

O voto ainda lança dúvidas sobre eventuais efeitos perante terceiros após o registro do instrumento em cartório: "Não se pode olvidar que é bastante discutível se essas espécies de registro, por si sós, seriam suficientes para conferir oponibilidade erga omnes quanto ao regime de bens da união estável, seja porque o próprio art. 5º do Provimento nº 37 do CNJ estabelece que 'o registro de união estável decorrente de escritura pública de reconhecimento ou extinção produzirá efeitos patrimoniais entre os companheiros, não prejudicando terceiros que não tiverem participado da escritura pública', seja porque o registro de instrumento particular poderia, em tese, ser realizado em cartórios de quaisquer localidades, o que dificultaria sobremaneira a pesquisa a ser empreendida pelo terceiro".

Referência: Recurso Especial 1.988.228-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 07/06/2022, DJe 13/06/2022, obtido em www.stj.jus.br.

 



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