3ª Turma do STJ nega recurso de herdeiras que buscavam responsabilizar, pela perda de uma chance, pessoa jurídica do ramo alimentício que deixou de apresentar seus livros societários para subsidiar impugnação de alegada doação inoficiosa por um de seus sócios


Notícias 08/11/2022

No caso dos autos, as autoras ajuizaram ação indenizatória de danos materiais e morais sob o fundamento de terem recebido participação acionária inferior ao que era efetivamente devido, em razão de doações inoficiosas que teriam diluído a participação social do seu falecido genitor em favor dos demais filhos, irmãos unilaterais das autoras. Os pedidos formulados foram julgados improcedentes pela sentença de primeiro grau, a qual foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP).

Em sede de recurso especial, as recorrentes requereram o provimento do recurso para julgar procedente a ação indenizatória pela perda de uma chance de sucesso na declaração de nulidade das doações feitas a seus irmãos unilaterais, em razão da conduta da pessoa jurídica, que deixou de apresentar, em ação de exibição de documentos, dois livros societários, que supostamente comprovariam ter o falecido pai delas doado somente aos outros filhos cotas de sua participação societária.

No julgamento do recurso especial, o relator, Min. Paulo de Tarso Sanseverino, destacou que “a controvérsia central do processo situa-se em torno da responsabilidade civil da empresa demandada por perda de uma chance, especialmente a viabilidade de indenização da chance perdida, em razão da dificuldade de obtenção de elementos probatórios em prazo hábil para impugnação de alegadas doações inoficiosas”. Nesse sentido, afirmou que os pressupostos para o reconhecimento da responsabilidade civil pela chance perdida do ajuizamento de ação judicial, no caso concreto, foram bem sintetizados no acórdão do TJSP, sendo eles: “(i) a viabilidade e a probabilidade de sucesso de futura ação declaratória de nulidade de doações inoficiosas; (ii) a viabilidade e a probabilidade de sucesso de futura ação de sonegados; (iii) a existência de nexo de causalidade entre o extravio de dois livros e as chances de vitória nas demandas judiciais.”

Ainda, em seu voto, o Min. Paulo de Tarso Sanseverino perpassou por outras nuances do caso, esclarecendo que “doação inoficiosa é aquela que excede a parte disponível do doador, com herdeiros necessários, prejudicando a sua legítima”, e que o seu reconhecimento “exige basicamente dois pressupostos:

a) a existência de herdeiros necessários;

b) a superação da parte disponível.” No entanto, “a inoficiosidade não resulta apenas da superação da metade disponível, pois, se o donatário for um dos herdeiros necessários do doador, deverá ser considerada também a sua quota hereditária”, explicitou o ministro.

Em análise do caso concreto, a Terceira Turma do STJ reconheceu, por fim, a prescrição da pretensão restituitória de participação acionária em decorrência de suposta invalidade das doações por inoficiosas, pretensão essa que estava sujeita ao prazo prescricional vintenário, previsto no art. 177 do Código Civil de 1916, vigente à época dos fatos. Concluiu também que rever a conclusão do acórdão recorrido quanto à ausência de comprovação de danos decorrentes da perda de uma chance - conclusão formada com base nos elementos fáticos existentes nos autos -, demandaria o reexame de provas, o que encontra óbice no Enunciado nº 7/STJ. Assim, foi negado provimento ao recurso especial das demandantes, ficando prejudicado o recurso especial da empresa demandada.

Com este julgamento, ficou evidenciado que existe estreita conexão entre as restrições à liberdade de doar e as regras de direito sucessório, sendo a previsão de nulidade da doação inoficiosa uma forma de consagrar a proteção à legítima dos herdeiros necessários.

Referência: Recurso Especial 1.929.450-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/10/2022, DJe 27/10/2022, obtido em www.stj.jus.br.




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